Desterrados em nossa própria terra?
Sérgio Buarque De Holanda toma a questão da identidade brasileira para seu discurso. Acredita que o povo brasileiro é uma espécie de “neo-português”, sendo esta é a desgraça do Brasil. Todas as nossas instituições e idéias vêm de Portugal, na forma de tradição, herança, etc. Isso inibe a mobilidade social, pois os mecanismos de mobilidade social portuguesa não se alteram, já que Portugal não possui uma revolução em pró do avanço social que possuía na Idade Média. As classes herdadas deste período mantêm seu prestígio, são “status” sociais mantidos até o tempo presente.
A família, além de ter uma representatividade biológica, também é representante política. A manutenção do controle político é baseada nela. O Estado liderado pelas famílias herdeiras do poder precisa da desordem para se justificar. Ele é violento, pois não se preocupa com a individualidade do indivíduo, esse tipo de política permite a criação de diversos “reinos particulares”, abrindo uma brecha ao autoritarismo, como podemos ver, a uma ditadura militar que foi levantada com a ajuda da classe média brasileira, que são das mesmas famílias que até hoje possuem prestígio social e político.
Num ambiente onde não há acordos públicos como no Brasil, não há escolha de um líder, é mantido quem sempre esteve lá, afinal “em terra de barões, quem é rei?”. Por isso, o brasileiro não escolhe uma pessoa semelhante para liderar, ele não se vê na capacidade de liderar, logo, um indivíduo semelhante a ele também não seria hábil a isso. Consequentemente ele escolhe para liderar aquela pessoa que, para ele, está mais qualificada para este cargo. Por isso a elite é mantida no poder pelo povo, pois esta elite já tem grande histórico de liderança, por mais populista que possa ser. O poder se mantém centralizado, já que para o brasileiro não existe outra forma de poder. Esta centralização é feita na elite, pela pessoa distante, não semelhante, por isso, quem fica na liderança é o líder carismático de Weber.
Outra herança que possuímos vinda dos portugueses é a questão do trabalho e do esforço público. O sacrifício brasileiro é autoconstrutivo e não de construção pública. As obras públicas são associadas a políticas familiares. O povo do Brasil não assume um compromisso social e público, para isso, ele renuncia toda a sua personalidade, ele opera coletivamente por meios afetivos, e não por anonimato. Ele não faz esforços para o geral, pois de sua herança ibérica, o valor que uma pessoa possui é valido de acordo com os seus méritos, é a individualidade brasileira, cada um por si. Entretanto, e somente, ajuda quando um próximo que precisa da ajuda. Seu sacrifício é afetivo, nunca público.
A herança ibérica vai além, vai contra a qualquer instrumento que oponha ao livre arbítrio; é o caso das leis. A lei e a ordem no Brasil surgem antes das necessidades de uma sociedade devidamente brasileira para tal. A lei vem do exterior, seguindo as necessidades e paixões portuguesas, onde há o culto ao ócio contemplativo, ao senhorio e ao livre arbítrio. Por isso as leis aqui também não se enquadram a um povo original, nossa forma de lei é de acordo com um povo que quer ser senhor, porém somos servos e nos mantemos assim. Afinal de contas, o brasileiro concorda com a lei, ele não fará esforços para mudá-la, pois isso é um sacrifício público. Só se sentirá e irá perceber as irregularidades quando ele for afetado, aí ele abandonará a sua individualidade, se juntará a um coletivo para buscar um benefício que irá beneficiá-lo, ele nunca faria isso sem ter nada em “troca”.
Concluo assim que o povo brasileiro não possui uma personalidade própria, seu modo de produção, forma de convício, atividade política e tudo o que forma sua vida; são heranças dos portugueses. Por isso o Brasil ainda se enquadra na sociedade patriarcal e nem atua com igualdade.
Não penso que a falta da personalidade do povo brasileiro esteja ligado à herança portuguesa, acredito que os nossos problemas estão longe do nosso companheiro lusitano. Claro, muita coisa diz respeito à nossa história e nosso pensamento de colônia, mas acredito que muitos dos nossos problemas atuais fomos nós mesmo quem criamos e estamos nos esforçando tanto para não resolver...